Niterói não só irá antecipar o pagamento, como pretende quitar o estoque de precatórios até 2026, aproveitando a janela de oportunidade do ingresso de royalties do petróleo nos cofres públicos.
O Governo Federal apresentou na segunda-feira, dia 9 de agosto, ao Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para parcelar os precatórios a partir do ano que vem. Os precatórios constituem dívidas reconhecidas em decisões judiciais definitivas que não são mais passíveis de recursos. Logo, dívidas obrigatórias a serem necessariamente honradas pelo governo.
A PEC tem como finalidade liberar R$33,5 bilhões no próximo ano para custear políticas como a criação de um novo Bolsa Família, cujo objetivo é aumentar o valor médio pago em 50% dos atuais R$189 e ampliar o número de beneficiários.
Na proposta, os valores acima de 66 milhões poderão ser pagos em dez parcelas, sendo 15% à vista e o restante em parcelas anuais. Os outros precatórios poderão ser parcelados caso a soma seja superior a 2,6% da receita corrente líquida da União, sendo o critério de parcelamento pelo maior valor. Já os precatórios abaixo de R$66 mil estariam fora da regra.
A proposta também prevê a alteração do indexador dos precatórios devidos pela União. Atualmente as dívidas são corrigidas pelo IPCA somado aos juros da poupança, o que levaria a um aumento acima de 10% do valor devido. Na PEC os precatórios seriam corrigidos pela taxa básica de juros (5,25% ao ano atualmente), o que reduziria o montante a ser pago aos credores.
A Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal destacou o risco à “institucionalidade das contas públicas”, uma vez que precatórios constituem despesa “obrigatória, líquida e certa” cabendo ao governo honrá-la. Também ressaltou que o valor de R$90 bilhões previsto para 2022 frente aos R$54,7 bilhões orçado para este ano não deve ser assumido como um “fato novo” considerando que é papel do Ministério da Economia de posse das informações da Advocacia Geral da União (AGU) mapear tais riscos fiscais. Além disso, a PEC tem sido julgada como uma tentativa do Governo Federal de burlar o teto de gastos, abrindo espaço para mais despesas não previstas.
Tais mudanças nas regras do jogo assemelham-se a práticas corriqueiras no país denominadas “contabilidade criativa” e maculam a credibilidade do governo. Analistas avaliam que o aumento da percepção de risco do mercado tende a impactar negativamente na economia pela possibilidade de elevar a taxa de juros. Com o parcelamento há a incidência de juros e correção monetária, podendo transformar em verdadeira “bola de neve” as dívidas estatais, que podem demandar grande lapso temporal para serem desfeitas.
No âmbito dos entes subnacionais, a Emenda Constitucional 109/2021 – que estabeleceu uma série de alterações nas regras fiscais como contrapartida ao repasse de recursos para socorrer os entes no contexto da pandemia de Covid-19 – possibilitou esticar o prazo para pagamento dos precatórios para 2029. A medida atendeu a um apelo de estados e municípios a fim de liberar espaço fiscal para medidas de mitigação dos efeitos da pandemia e a possibilidade de abrir margem para realizar investimentos na retomada da economia.
Niterói pretende zerar o estoque de precatórios
No caso de Niterói aderimos ao regime especial de adimplemento dos precatórios junto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) em março de 2010. De lá para cá, já pagamos mais de R$402 milhões. O percentual de pagamento nesse regime especial em 2021 foi de 1,3% ao mês sobre um doze avos da Receita Corrente Líquida. A nova proposta a ser apresentada ao TJRJ por Niterói pretende zerar o estoque da dívida, atualmente em R$154 milhões, até, no máximo, 2026. A partir desse período o município voltaria ao regime ordinário de pagamento.
Cumpre destacar que a intenção de quitar o estoque de precatórios até 2026 busca aproveitar a janela de oportunidade do ingresso de royalties do petróleo nos cofres para quitar dívidas que impactam na saúde financeira do município de Niterói para as futuras gerações. A virada de chave que facultou a utilização dos royalties para o pagamento de precatórios foi a Emenda Constitucional 99/2017. A partir dela, Niterói saiu de um patamar de pagamento de R$40 milhões em 2017, chegando a R$79 milhões em 2019 – o maior valor pago da dívida de precatórios da história da cidade.
O ingresso expressivo de recursos de royalties no caixa e a disciplina fiscal têm permitido a Niterói quitar suas dívidas. Em abril de 2018 o então Prefeito Rodrigo Neves e o Secretário de Fazenda Pablo Villarim negociaram um empréstimo contraído pelo então prefeito Moreira Franco em 1970 na casa de R$7 milhões de dólares. A negociação reduziu a dívida para R$3,5 milhão de reais a valores presentes e foi quitada à vista, antes do prazo final, em 2024.
Muito mais que um gesto, o governo revelou credibilidade para honrar o pagamento de dívidas contraídas aproveitando o momento de bonança e saúde financeira do município. Pavimentou o caminho que seguimos hoje de honrar dívidas como os precatórios e quitá-las antes do prazo final. Este fato representou também o empenho na renegociação das dívidas de modo a reduzir significativamente o saldo devedor livrando o município de perder recursos tão importantes para custear políticas sociais e investimentos no desenvolvimento da cidade.
Ainda que estejamos empenhados em quitar o estoque dos precatórios antes do prazo concedido pelo Governo Federal em função da boa saúde fiscal, assumimos também o compromisso de, a partir deste ano, realizarmos um levantamento das maiores dívidas de precatórios e refazermos os cálculos dos processos de modo a garantir que estejamos pagando o que é justo e correto. Sem contabilidade criativa, com medidas de eficiência e responsabilidade: é assim que construímos a credibilidade com a população de Niterói de honrar os nossos compromissos.